domingo, 6 de janeiro de 2013

Histórias da vida real #2

"Pode ser o perigo que o atrai, pensa. O facto de estar a transpor um limite perigoso. (...) Ou pode ser simplesmente o facto de ela pertencer a outro." Joanne Harris, "Rapaz de Olhos Azuis" 

   Conhecem-se de vista desde o tempo da escola primária.
   Ela sempre achou estranho aquela alcunha dele. Ele sempre achou estranho aquele nariz vermelho que lhe é tão característico.
   Não se dão. Pelo menos, não até há uns dois anos atrás. Amigos comuns fazem-nos conhecer pessoas improváveis. Conhecerem-se mostrou que nenhum dos dois era, na realidade, aquilo que os dois suponham a priori.
   Aquele ar arrogante revela alguém bastante mais sensível, mais amigo. Aquele ar convencido revela alguém bastante mais humano, mais ingénuo e altruísta. As suas conversas resumem-se, num dado momento, àquele único assunto. Aborrecido para todos mas, aparentemente, não para eles. Encontram, naquela fracção de segundo, uma ponte entre os dois mundos, uma conexão inesperada. E tudo cresce.
   Ela encontra alguém. Apaixona-se. Ele encontra alguém. Apaixona-se. Corre bem para ela: relação duradoura. Corre mal para ele: ela só quer sexo e consegue o que tem, deixando-o depois disso. 
   Ataque cardíaco e alguém morre. Melhor amigo dele. Amigo muito estimado dela. Ele entra em depressão e ninguém se apercebe. A não ser ela. Ele encobre tudo com o sorriso. Não o suficiente.
   Ele começa a sentir-se estranho. Sabe que sentimentos começam a ser misturados. E não é bom. Ela nunca olhará daquela forma para ele. Ela tem alguém. Mesmo assim, em situações inapropriadas, ele bebe demais (talvez queira apenas afogar as muitas mágoas), fala demais. Diz-lhe o que acha que sente. Diz-lhe que o sente há muito tempo. Ela não acredita. Ou, talvez, apenas queira encobrir uma situação constrangedora. 
   Sóbrio, desculpa-se. Nada volta a ser igual. Ele afasta-se. Ela sente falta daquela amizade. Sente falta daquela ponte. Ele sente o mesmo. Tenta reatar toda a amizade que tinham. Tenta fazê-la pensar de outra forma. Abre-lhe os olhos a outra perspectiva. Consegue. Aceitam-se. Aceitam as pessoas que, agora, ambos têm na sua vida.
    Agora? Resta-lhes cultivar esta flor, tão rara, da amizade verdadeira.



(Soundtrack: Within Temptation)

1 comentário:

Lani disse...

Que lindo, gostei :)

R: É verdade! Espero ter paciência quando o meu estiver grande xD *